Qualidade Vivida

terça-feira, 9 de setembro de 2014

Tempo: compositor de destino...

Tem uma cena no Banquete, de Platão, que me emociona muito, que é quando Aristófanes define a origem de Eros como sendo o que está a procura do outro, e, para ele, Eros é o mais amigo do homem. Nesta origem, eram três os gêneros da humanidade, e não como agora, o masculino e o feminino. Havia um terceiro, comum a estes dois, o "andrógeno", que era diferente na forma e no nome. No início, dizia ele, éramos compostos de duas partes, ou todas as duas masculinas, ou todas as duas femininas, ou uma metade feminina e a outra masculina, que foram separadas por Zeus. Desta forma, o Amor para Aristófanes (que era um comediante) seria uma espécie de busca pela metade que se perdeu e é aí que aparece, claramente, a função desejante de Eros pela primeira vez, entre os discursos do Banquete.


     ...O motivo disso é que nossa antiga natureza era assim e nós éramos um todo; e portanto

     ao desejo e procura do todo que se dá o amor (Platão.O Banquete. 193 a)


Pensar em Eros como Amor e como Amigo é tão profundo e tão completo... Muitas são as metáforas platônicas que me encantam, certamente... Ter passado boa parte da minha vida apressada por esse encontro, me afastou dele terrivelmente... A minha metade homem precisava trabalhar para colocar dinheiro dentro de casa. A minha metade mulher precisava passar, lavar, cozinhar, arrumar a casa, colocar as crianças para a escola e ainda ensiná-las a se virarem, posto que ensinar a ler, escrever e contar não era função minha, mas da escola. A mim cabia tão somente dar estrutura para que a aprendizagem acontecesse, e quando falo de estrutura me refiro ao termo no latu senso: amor, carinho, lar, comida na mesa, respeito ao próximo, etc, etc, etc...

E nessa mistura de gêneros que me foi imputada tão marcadamente em suas funções: o homem é o que trabalha fora e a mulher a que cuida da casa e dos filhos, eu construí a minha identidade masculina e feminina. O problema foi que elas sempre estiveram tão ocupadas que nunca se encontraram... E assim, não fizeram amor, não foram amigas, não se ajudaram na saúde, porque simplesmente não se conheciam. Foi preciso me deixar adoecer para que elas finalmente se encontrassem.

A quem pertence o tempo? Quem o fabricou? Para que me deixei ser controlada por ele, como se ele fosse um agente externo?

Sim... foi ter compreendido que sou eu quem o defino e priorizo, logo o governo, que tornou-se possível o encontro das minhas duas metades, em mim... Tempo: compositor do meu destino...





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