Qualidade Vivida

sábado, 28 de maio de 2011

Sobre as estranhas formas de amar...

Ontem foi dia de maratona em terapia. Maratona em terapia é quando os grupos da minha terapeuta se reúnem em um único dia para um mergulho ainda mais profundo, nas nossas questões mais estranhas...
Eu amo esses encontros, por mais mexida que eu saia deles...
A maratona estava marcada para às 19h., mas o meu processo de mergulho ancestral começou pela manhã, quando conversava com dois amigos sobre os meus estranhos avós, pais da minha mãe. E é sobre eles que falo hoje...
Meus avós foram um casal fora do seu tempo, aliás fora de qualquer tempo...
Eles se amavam do jeito deles e não permitiam que ninguém interferisse em suas vidas afetiva. Foram casados por 46 anos, separados apenas pela morte.
Meu vô era um homem lindo, com par de olhos azuis invejáveis e dono de uma sabedoria de vida muitíssimo singular... Um amante fiel!
Minha avó era uma linda mulher, dona de um par de olhos verdes indescritíveis e de uma silhueta de parar o trânsito (como eles gostavam de dizer na época)... uma amante nada fiel...
Os dois tinham uma vida incomum no casamento. Eles podiam se relacionar com outros pares e isso não afetava a relação de um com o outro. Eram casados e se amavam o suficiente para não conseguirem viver um sem outro e isso bastava. Mas meu avô tinha uma amante de toda uma vida: a Antunieta. Uma mulher mais velha e que dedicou a sua vida ao meu avô. Minha avó não se incomodava com aquilo porque ela tinha a vida sexual dela da maneira que ela desejava - meu avô não implicava desde que ela continuasse ao seu lado. E quem disse que ela queria ficar longe dele?
Pouco antes do meu vô morrer, ele chamou minha vó e fez seu último pedido: "Cuide da Antunieta, ela dedicou a vida dela a mim e não tem ninguém além de mim". Depois do enterro, minha vó chamou a minha mãe e contou-lhe sobre a vida deles (minha mãe escandalizou), pediu que não os julgassem e que fosse com ela até a casa da Antunieta para buscá-la para morar com ela. Assim foi feito. Mas Antunieta morreu uma semana depois da morte do meu avô. Nunca soube de ninguém com tanta disponibilidade para amar o próximo como a minha vó Gina... Lembro-me de uma passagem dela comendo jaca ao pé de uma jaqueira
e contando histórias... curti tão pouco a minha avó... Lembro-me dela recolhendo pessoas na rua para alimentar... criança não ficava sem comer se passasse perto dela e ela tinha um carinho especial com idosos... morreu serena, dormindo!
Meus avós eram especiais... hoje, olho para a vida deles e acho que eles viveram melhor do que imaginavam que seria possível porque tinham uma maneira diferente de compreender o casamento... hoje, eu aprendi que não devemos julgar a vida alheia... é cruel não com o outro, mas com a gente do momento em que o julgamento da vida do outro nos coloca no cativeiro das nossas moralidades estúpidas.
Maratona terapêutica e o tema: "dar e receber afeto indistintamente, a partir do acolhimento e do perdão para com a mãe"
Sabem de uma coisa... graças a Deus minha mãe teve a família dela tão estranha... graças a Deus eu tenho uma mãe tão linda e protetora... com certeza minha mãe aprendeu com a sua mãe sobre perdoar, sobre amar o próximo... e eu... bem, eu tive o privilégio de ser filha da Iris e do Adilson e de suas deliciosas formas de acolher o outro... só somos capazes de acolher o outro se conseguimos acolher a nós mesmos, nas nossas mais estranhas formas de ser... sim, eu me aceito incondicionalmente...

Obrigada vô Domingos e Vó Gina... eu aprendi a amá-los

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